Mais do que colocar alunos com necessidades especiais em escolas comuns, política de inclusão deve ser pensada como um processo com várias etapas.
Falar sobre políticas públicas para a educação especial requer, antes de mais nada, um entendimento histórico do tema. Fazendo uma breve visita ao passado, verificamos que o tratamento dado pelas antigas civilizações às pessoas com transtornos diversos configura uma mancha em nossa história. Práticas que vão desde o infanticídio ao se observar "anormalidades" nas crianças até a internação em prisões na Idade Média caracterizam a completa rejeição desses indivíduos pela sociedade.
Falar sobre políticas públicas para a educação especial requer, antes de mais nada, um entendimento histórico do tema. Fazendo uma breve visita ao passado, verificamos que o tratamento dado pelas antigas civilizações às pessoas com transtornos diversos configura uma mancha em nossa história. Práticas que vão desde o infanticídio ao se observar "anormalidades" nas crianças até a internação em prisões na Idade Média caracterizam a completa rejeição desses indivíduos pela sociedade.
Apesar dos avanços, muitas ações ainda marcam uma constante luta contra a rejeição e a discriminação. É o caso, por exemplo, do movimento antimanicomial, iniciado ainda em 1987 com o objetivo de conscientizar a população de que as pessoas com sofrimento mental devem ser acolhidas, cuidadas e tratadas como sujeitos com direito de estar no convívio social.
No entanto, com a evolução das democracias modernas na direção de questionar e superar práticas sociais baseadas na desigualdade, é possível observar conquistas em relação às políticas públicas de inclusão dos indivíduos com necessidades especiais.
Maria Auxiliadora Monteiro, professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Belo Horizonte (PUC-MG), explica que somente a partir da segunda metade do século passado é que o tema passou a ser agenda das políticas públicas. "Antes disso, o que havia eram campanhas episódicas que mostravam a importância de se ter sensibilidade para com sujeitos com necessidades especiais, sobretudo surdos e cegos; quer dizer, não havia políticas definidas."
Em 1959, após manifestação de rejeição às escolas segregadas feita por associações de pais, a Dinamarca incluiu em sua legislação o conceito de "normalização" - entendido como possibilidade do portador de necessidade especial desenvolver um tipo de vida o mais normal possível. Este evento tornou-se um marco na educação inclusiva, por ter resultado no primeiro documento oficial recomendando a integração de alunos com necessidades especiais às escolas comuns.
No Brasil, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 (LDB 4.024/61) é explicitado pela primeira vez em um documento que a educação é um direito de todos e, também, é recomendada a integração da educação especial ao sistema comum de ensino.
Mais recentemente, dentre outros documentos - como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Conferência Mundial de Educação para Todos, ambos de 1990 -, Maria Auxiliadora Monteiro destaca a Portaria 1793/94 do Ministério da Educação, que recomenda que seja incluída nos cursos de graduação em Pedagogia, Psicologia, e nas licenciaturas em geral, uma disciplina que trate da questão da educação inclusiva. Também no ano de 1994, a Declaração de Salamanca é publicada e desde então considerada mundialmente como um dos mais importantes documentos visando a inclusão social. Realizado na cidade de Salamanca, na Espanha, o evento que culminou na Declaração reuniu representantes governamentais de 88 países e 25 organizações internacionais, com o intuito dos Estados assegurarem a equalização de oportunidades para pessoas com necessidades especiais.
Seguindo essa tendência, o Plano Nacional de Educação brasileiro, em 2001, abordou a inclusão das crianças com necessidades especiais na escola regular e, também, a capacitação dos docentes. O documento prevê, por exemplo, o prazo de um ano para a elaboração de padrões mínimos nacionais de infraestrutura, incluindo adaptação dos edifícios escolares para o atendimento dos alunos com necessidades especiais.
Maria Inês Naujorks, professora do Departamento de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM-RS), no entanto, reforça a necessidade de práticas que vão além de documentos legais. "Não há lei que dê conta dessa complexidade. A legislação, por si só, não garante nada." A professora explica que o paradigma da inclusão implica, necessariamente, repensar as práticas educacionais em todos os níveis de ensino, considerando o princípio fundamental da educação de qualidade como um direito de todos.
A inclusão, delegada como mais uma tarefa à escola, representa a necessidade de superação de muitas contradições no sistema educacional. Apesar das dificuldades, para Naujorks este processo torna-se um momento oportuno para possíveis mudanças, como a renovação das escolas e a inovação das práticas pedagógicas. "O paradigma da inclusão estimula a aprendizagem não só dos alunos, mas de todos os envolvidos no processo educativo: gestores, docentes, serviços de apoio escolar, família, comunidade."
Maria Salete Aranha, professora aposentada do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília, lembra que a educação inclusiva não deve ser caracterizada como a educação para pessoas deficientes. "É uma educação de qualidade para toda e qualquer pessoa, que promova o acesso de todos e responda às necessidades educacionais de cada aluno."
A legislação estabelece que a educação especial, no contexto da educação inclusiva, deve oferecer para os alunos com necessidades educacionais especiais alguns tipos de serviços, chamados de suportes. Aranha explica que entre esses suportes está a sala de recursos, que deve contar com todos os equipamentos, materiais e maquinários diferenciados necessários para responder às demandas de alunos com necessidades especiais. Por exemplo, para o aluno com deficiência visual, a sala deve oferecer máquina de datilografar, livros e materiais de estimulação, todos em Braille.
Apesar das indicações para o uso de diversas estratégias metodológicas que possam facilitar o aprendizado, Monteiro acredita que, por enquanto, esta prática inclusiva ainda é bastante deficitária. Segundo a professora, muitas escolas não resolveram questões básicas como a construção de rampas e de banheiros adaptados. Assim, o individuo com necessidades especiais acaba inserido em um ambiente que não lhe provê a atenção e os recursos necessários para que ele possa se desenvolver plenamente, e é esperado que ele se adapte. "Em uma pesquisa minha, nós detectamos que um menino de 10 anos com nanismo não ia ao banheiro porque ele não alcançava o vaso. E a escola deu um banquinho pra ele ir ao banheiro. Era uma coisa extremamente discriminatória."
Outro fator apontado por Monteiro diz respeito à formação do professor. Apesar de recomendado pelo MEC, muitos cursos de Pedagogia e licenciaturas, de um modo geral, não oferecem disciplinas que tratem de questões sobre a inclusão. E, para os profissionais em exercício, são raros os cursos de educação continuada na área.
Assim, é possível verificar que a existência de políticas públicas, por si só, não tem garantido que o processo de inclusão ocorra em condições adequadas. Naujorks explica que uma das questões importantes nesse processo diz respeito à atitude das pessoas frente à diferença. "No que se refere aos docentes, é fundamental a competência para saber lidar com essa diferença em sala de aula. Isto implica na organização, elaboração e adequação de produção de materiais didáticos." No entanto, não se trata da culpabilização dos professores, e sim da defesa de melhores condições de trabalho, salariais, e até mesmo da formação de qualidade.
Implantar esta política implica, na verdade, em uma série de processos nos quais os documentos legais e os professores são apenas pontos, cada um em um extremo. A professora da UFMS reforça que além da competência dos gestores escolares, da vontade dos pais e do relacionamento entre os alunos, a política de inclusão da educação especial necessita de um aporte de recursos financeiros. "Se considerarmos o que um projeto assim implica em termos de recursos humanos, de equipamentos e de adaptação dos espaços físicos, a conta é alta. Não há como privilegiar apenas um aspecto, como por exemplo a formação de recursos humanos. Há que se considerar o conjunto."
Segundo Monteiro, a falta de estrutura física adaptada e pessoal treinado tem feito com que muitos pais peçam a volta das escolas especiais. A professora considera que o ensino praticado nas escolas especiais não é necessariamente segregador, pois elas dispõem de uma estrutura condizente e de equipes multidisciplinares capazes de atender as necessidades desses alunos. "Apesar do lema politicamente correto, a política de inclusão é na verdade uma inclusão excludente. Do jeito que está sendo praticada eu vejo nessa inclusão uma racionalidade financeira, porque as escolas especiais são muito caras."
A professora lembra também a lentidão em relação ao repasse de verbas e as mudanças de planejamento atreladas a mudanças de governo. "Entra um governo, faz uma coisa, entra outro e muda tudo. Nós não temos políticas de Estado, nós temos políticas de governo."
No Brasil, através da Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1961 (LDB 4.024/61) é explicitado pela primeira vez em um documento que a educação é um direito de todos e, também, é recomendada a integração da educação especial ao sistema comum de ensino.
Mais recentemente, dentre outros documentos - como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Conferência Mundial de Educação para Todos, ambos de 1990 -, Maria Auxiliadora Monteiro destaca a Portaria 1793/94 do Ministério da Educação, que recomenda que seja incluída nos cursos de graduação em Pedagogia, Psicologia, e nas licenciaturas em geral, uma disciplina que trate da questão da educação inclusiva. Também no ano de 1994, a Declaração de Salamanca é publicada e desde então considerada mundialmente como um dos mais importantes documentos visando a inclusão social. Realizado na cidade de Salamanca, na Espanha, o evento que culminou na Declaração reuniu representantes governamentais de 88 países e 25 organizações internacionais, com o intuito dos Estados assegurarem a equalização de oportunidades para pessoas com necessidades especiais.
Seguindo essa tendência, o Plano Nacional de Educação brasileiro, em 2001, abordou a inclusão das crianças com necessidades especiais na escola regular e, também, a capacitação dos docentes. O documento prevê, por exemplo, o prazo de um ano para a elaboração de padrões mínimos nacionais de infraestrutura, incluindo adaptação dos edifícios escolares para o atendimento dos alunos com necessidades especiais.
Maria Inês Naujorks, professora do Departamento de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM-RS), no entanto, reforça a necessidade de práticas que vão além de documentos legais. "Não há lei que dê conta dessa complexidade. A legislação, por si só, não garante nada." A professora explica que o paradigma da inclusão implica, necessariamente, repensar as práticas educacionais em todos os níveis de ensino, considerando o princípio fundamental da educação de qualidade como um direito de todos.
A inclusão, delegada como mais uma tarefa à escola, representa a necessidade de superação de muitas contradições no sistema educacional. Apesar das dificuldades, para Naujorks este processo torna-se um momento oportuno para possíveis mudanças, como a renovação das escolas e a inovação das práticas pedagógicas. "O paradigma da inclusão estimula a aprendizagem não só dos alunos, mas de todos os envolvidos no processo educativo: gestores, docentes, serviços de apoio escolar, família, comunidade."
Maria Salete Aranha, professora aposentada do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Marília, lembra que a educação inclusiva não deve ser caracterizada como a educação para pessoas deficientes. "É uma educação de qualidade para toda e qualquer pessoa, que promova o acesso de todos e responda às necessidades educacionais de cada aluno."
A legislação estabelece que a educação especial, no contexto da educação inclusiva, deve oferecer para os alunos com necessidades educacionais especiais alguns tipos de serviços, chamados de suportes. Aranha explica que entre esses suportes está a sala de recursos, que deve contar com todos os equipamentos, materiais e maquinários diferenciados necessários para responder às demandas de alunos com necessidades especiais. Por exemplo, para o aluno com deficiência visual, a sala deve oferecer máquina de datilografar, livros e materiais de estimulação, todos em Braille.
Apesar das indicações para o uso de diversas estratégias metodológicas que possam facilitar o aprendizado, Monteiro acredita que, por enquanto, esta prática inclusiva ainda é bastante deficitária. Segundo a professora, muitas escolas não resolveram questões básicas como a construção de rampas e de banheiros adaptados. Assim, o individuo com necessidades especiais acaba inserido em um ambiente que não lhe provê a atenção e os recursos necessários para que ele possa se desenvolver plenamente, e é esperado que ele se adapte. "Em uma pesquisa minha, nós detectamos que um menino de 10 anos com nanismo não ia ao banheiro porque ele não alcançava o vaso. E a escola deu um banquinho pra ele ir ao banheiro. Era uma coisa extremamente discriminatória."
Outro fator apontado por Monteiro diz respeito à formação do professor. Apesar de recomendado pelo MEC, muitos cursos de Pedagogia e licenciaturas, de um modo geral, não oferecem disciplinas que tratem de questões sobre a inclusão. E, para os profissionais em exercício, são raros os cursos de educação continuada na área.
Assim, é possível verificar que a existência de políticas públicas, por si só, não tem garantido que o processo de inclusão ocorra em condições adequadas. Naujorks explica que uma das questões importantes nesse processo diz respeito à atitude das pessoas frente à diferença. "No que se refere aos docentes, é fundamental a competência para saber lidar com essa diferença em sala de aula. Isto implica na organização, elaboração e adequação de produção de materiais didáticos." No entanto, não se trata da culpabilização dos professores, e sim da defesa de melhores condições de trabalho, salariais, e até mesmo da formação de qualidade.
Implantar esta política implica, na verdade, em uma série de processos nos quais os documentos legais e os professores são apenas pontos, cada um em um extremo. A professora da UFMS reforça que além da competência dos gestores escolares, da vontade dos pais e do relacionamento entre os alunos, a política de inclusão da educação especial necessita de um aporte de recursos financeiros. "Se considerarmos o que um projeto assim implica em termos de recursos humanos, de equipamentos e de adaptação dos espaços físicos, a conta é alta. Não há como privilegiar apenas um aspecto, como por exemplo a formação de recursos humanos. Há que se considerar o conjunto."
Segundo Monteiro, a falta de estrutura física adaptada e pessoal treinado tem feito com que muitos pais peçam a volta das escolas especiais. A professora considera que o ensino praticado nas escolas especiais não é necessariamente segregador, pois elas dispõem de uma estrutura condizente e de equipes multidisciplinares capazes de atender as necessidades desses alunos. "Apesar do lema politicamente correto, a política de inclusão é na verdade uma inclusão excludente. Do jeito que está sendo praticada eu vejo nessa inclusão uma racionalidade financeira, porque as escolas especiais são muito caras."
A professora lembra também a lentidão em relação ao repasse de verbas e as mudanças de planejamento atreladas a mudanças de governo. "Entra um governo, faz uma coisa, entra outro e muda tudo. Nós não temos políticas de Estado, nós temos políticas de governo."
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